As políticas de convivência com o semiárido que mudam a vida do homem do campo e a paisagem do Sertão
18 de março de 2019 - 15:08 #Agricultura Familiar #Convivência #desenvolvimento regional #semiárido
André Gurjão - Assessoria de Comunicação da SDA
Antes tido como vilão, o semiárido ganhou status de parceiro na vida do sertanejo. E esta época em que os cearenses olham mais intensamente para o céu, na projeção de uma boa temporada de chuvas, é também propícia para as análise das políticas públicas que garantem desenvolvimento regional e permanência do homem do campo. Conheça esta história de fé e conhecimento na série de três matérias da Coordenadoria de Imprensa do Governo do Ceará.
“Eu dormia de noite e pensava se o carro-pipa não passar amanhã, como vai ser?´. Tinha dia que tinha água e dia que tinha não. Passava de dois, três dias”, narra Otília Sena, de 77 anos. A moradora da comunidade Aroeiras, no município de Aracati, representa uma das 127 famílias atendidas pelo sistema de abastecimento d´água entregue pelo Governo do Ceará e não esconde a emoção de enxergar na conquista o rosto do próprio marido que faleceu há quatro anos, sem poder ver a água passando pela torneira de casa.
“Eu, quando me casei, tinha 23 anos de idade e morava aqui mesmo na Aroeira. Do outro lado acolá, mais longe. Vim morar aqui nessa casa e graças a Deus não me faltou mais nada. Meu marido era agricultor, trabalhador, batalhador, e lutava muito pela comunidade. Foi uma pessoa com muita garra de andar atrás dessa água que ele morreu e não viu. Mas quem ficou viu, né?”, contou. “Eu trabalho aqui nesse roçado, mas quando tô limpando ele tá do meu lado, me ajudando. Eu tenho aquela fé que ele tá aqui mais eu”, se emocionada.
Neste dia 19 de março, Dia de São José, os agricultores como Otília têm muito o que comemorar. Para além do anúncio de novos recursos para a quarta etapa do Projeto São José, a ser realizado no feriado que celebra o Santo Padroeiro, o homem e a mulher do campo têm à mão políticas públicas que incentivaram a convivência com o semiárido e a permanência dos trabalhadores rurais no interior do Estado. São iniciativas intersetoriais, mas capitaneadas pela Secretaria do Desenvolvimento Agrário (SDA), que destinaram investimentos em ações voltadas à segurança hídrica e alimentar, assistência técnica, apoio às cadeias produtivas, regularização fundiária, trabalho e renda, saneamento básico e inclusão social. A ação de segurança hídrica foi reforçada com construção de milhares de cisternas de primeira água para consumo humano e as cisternas destinadas à produção agrícola. Além disso, através do Programa Água Para Todos, foram centenas de poços prfundos perfurados, além da instalação de chafarizes e barragens subterrâneas.
Convivência com o semiárido
Outra aposta da secretaria é o uso das tecnologias sociais, como as técnicas de reusos d´água de cinzas domiciliares. O equipamento reutiliza o descarte d´água de pias e banheiros domésticos custa bem pouco e faz toda a diferença no quintal. Através de uma complexa trama de canos e filtragens duas filtragens físicas e uma biológica é possível reduzir o consumo d´água na hora de plantar, enriquecer o solo com nutrientes e colaborar na preservação do meio ambiente.
“Antes, para o jovem trabalhar, tinha que ir para cidade e o (Projeto) Paulo Freire me deu essa oportunidade: para que eu ficasse aqui na propriedade trabalhando junto aos meus pais”, narra o jovem agricultor Gino Barroso, de apenas 24 anos, sobre os benefícios que o projeto de combate à extrema pobreza trouxe para própria vida. “Eu já fazia os plantios e a assistência técnica veio para melhorar esse cuidado com as minhas plantas e com os animais – e também passei a melhorar a renda aqui de casa com as minhocas que a gente cria a partir do reuso”, completa.
Com uma ajuda da inclinação do terreno, a primeira etapa acontece numa caixa de gordura onde toda sujeira de óleos e resíduos domiciliares é filtrada e encaminhada por meio de tubulação ao minhocário. Aqui, os resíduos orgânicos são tratados pelo animal que habita em solos úmidos e precipitam por gravidade através das camadas de seixo, brita, areia lavada e serragem, que ficam logo abaixo, numa profundidade total de 2,5 metros. O material líquido restante desliza por mais um encanamento, quando é recolhido por uma caixa d´água e de lá bombeado para uma horta com pés de goiaba, amora, tomate-cereja, pimentão e quiabo.
“A tecnologia social é uma tecnologia para ajudar a vida do agricultor na zona rural, que seja fácil o acesso e a manutenção”, ilustra o conhecimento apreendido com as capacitações e oficinas do projeto. “No caso do biodigestor, a gente gera um gás (metano) e, a partir disso daí, não precisa mais você comprar o gás (de cozinha) – que a gente comprava aqui mesmo pela comunidade”, resume numa única frase a economia de quase R$ 80 no orçamento da família.
Nas portas do Céu
Mais do que nos outros dias do ano, é no 19 de março que os agricultores cearenses olham para o céu com mais fé. Muitos acreditam que se chove no dia em que se louva o santo padroeiro do Estado do Ceará, o carpinteiro e “pai terreno” de Jesus Cristo cumpre a promessa de enviar muita chuva nos três meses seguintes. Com isso, é só esperar o sinal do santo que a abundância na mesa das famílias do campo não há de faltar.
Curiosamente, o “Padroeiro dos Trabalhadores e das Famílias” é reconhecido apenas no saber popular como o responsável pelas chuvas no Nordeste brasileiro. É que nos outros 15 estados, e em todo mundo católico, é São Pedro quem porta as chaves para abrirem os céus e, com isso, determinar se fará chuva, ou Sol. Na dúvida de agradar um santo, ou outro, e garantir uma boa colheita, vale até mesmo acender duas velas: uma para cada santo, como forma de não desagradar ninguém.
“Eu te darei as chaves do reino dos céus e o que ligares na Terra será ligado nos céus, e o que desligares na terra será desligado nos céus.” (Mt 16:17-19).
Explicação científica
A crença sertaneja tem uma ponta de fundamento científico, garante a metereologista da Funceme, Meiry Sakamoto. Nos estados nordestinos mais próximos da linha do Equador, uma grande influência para determinar a quadra invernosa é a convergência de ventos alísios vindos do Norte e do Sul da linha imaginária que divide o globo terrestre em duas metades. Essa zona de convergência intertropical é de extrema importância para chuva em Estados como Piauí, Rio Grande do Norte e Ceará. Normalmente, quando é nessa época do ano, essa zona atravessa a região equatorial, atingindo três graus de latitude sul, chegando a esses Estados. Isso coincide justamente com o dia em que se comemora o santo padroeiro dos cearenses e de todos agricultores nesses estados.
Série Dia de São José
Amanhã você acompanha a cobertura completa da festividade no Estado, em especial a programação oficial que terá o anúncio dos investimentos do Projeto São José IV.